MadBizarrice: O mistério do homem de Somerton

Todos os anos, milhões de indigentes são enterrados no mundo todo. Pessoas que por algum motivo perderam seus documentos e consequentemente suas identidades, mas que cujos destinos tiveram a mesma consequência: a morte. Entretanto, alguns casos se tornaram mais do que apenas enterros comuns para as polícias locais. Um deles é do "homem de Somerton".
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O Corpo
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Era o primeiro dia do mês de dezembro no ano de 1948. A polícia recebeu um chamado às 6 horas da manhã para resgatar o corpo de um homem que tinha sido encontrado à beira da praia Somerton, na cidade de Adelaide, na Austrália.
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O "X" marca o lugar onde o corpo foi encontrado.
 
Aparentando ter entre 40 e 45 anos de idade, o homem branco com traços britânicos vestia uma camisa com gravata, sapatos, calça social e um casaco. Estranhamente nenhuma peça tinha etiquetas, fato incomum para a época, e ele também não usava um chapéu. Havia ainda um cigarro na parte de trás da orelha e outro fumado pela metade ao lado de seu rosto. O braço direito encontrava-se dobrado e o esquerdo esticado. Na verdade, o homem tinha uma boa condição física.
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Num dos bolsos do casaco havia um bilhete de ônibus de Adelaide para St. Leonards e um de trem para Henly Beach que não havia sido utilizado ainda. O ponto do tal ônibus ficava a 250m do lugar onde foi encontrado o corpo. Havia ainda um pente, um pacote de chicletes aberto, uma caixa de fósforos e um maço de cigarros.
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As Hipóteses
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O corpo não possuía cicatrizes, nem machucados, nada que pudesse atestar sua morte num primeiro momento. A primeira hipótese sobre sua morte foi suicídio. Afinal, quem iria à uma praia de roupa social?
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Algumas pessoas chegaram a ver o homem rondando pela praia na noite anterior. Parecia despreocupado, apenas dando um passeio. Alguns até pensaram que estava bêbado. Outros o viram deitado, imóvel e acharam que estava dormindo, por isso não o incomodaram.
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Os laudos da autópsia revelaram que a morte tinha ocorrido provavelmente às 2 da manhã. Seus órgãos internos, porém, mostravam outro cenário diferente da sua aparência externa. Eis aqui um trecho do laudo médico:
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O coração estava em seu tamanho normal, e normal em todos os demais aspectos (...) pequenos vasos incomuns de serem encontrados no cérebro eram facilmente discerníveis com congestão. A faringe estava congestionada, e o esôfago coberto por branqueamento das camadas superficiais da mucosa, com uma trilha medial de ulceração. O estômago estava profundamente congestionado (...) havia congestão também na 2ª metade do duodeno. Havia sangue misturado ao alimento no estômago. Ambos os rins estavam congestionados, e o fígado continha grande excesso de sangue em seus vasos (...) o baço apresentava inchaço expressivo (...) de aproximadamente 3 vezes seu tamanho normal (...) exame microscópico revelou a destruição de lóbulos do fígado (...) hemorragia gástrica aguda, congestão extensiva do fígado e baço, e congestão do cérebro.
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A segunda hipótese então foi de envenenamento. O problema é que não haviam traços de venenos em seu corpo, embora o estado de seus órgãos dissesse o contrário. De uma coisa os patologistas tinham certeza: não tinha sido morte natural.
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As Novas Pistas
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Embora o caso tenha sido divulgado no mundo todo, ninguém identificou o corpo e este acabou sendo embalsamado para ser preservado para futuras análises.
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Em janeiro de 1949, a polícia recebeu uma nova pista. Os funcionários da estação ferroviária tinham descoberto uma mala marrom sem etiqueta num guarda-volume. O registro marcava que a mala tinha sido guardada às 11 da manhã do dia 30 de novembro de 1948 e o dono nunca apareceu para pegá-la de volta. Dentro não tinha nada de excepcional, só um roupão, cuecas, pijamas, um barbeador, calças, uma chave de fenda, um pincel, linha de costura com agulha, uma faca e uma tesoura. Apesar de nenhum desses objetos conter identificação, os policiais acharam a marca “T. Keane” atrás de uma das gravatas, “Keane” em um saco de lavanderia e “Kean” em uma camiseta. Era óbvio que o nome Keane tinha sido poupado de propósito, mas só aumentou as dúvidas sobre o caso e não elucidou nada. T. Keane não constava em nenhum registro de desaparecimento nos países falantes de língua inglesa no mundo.
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Os investigadores então começaram a tentar refazer os passos do tal homem. Os dois bilhetes davam algumas pistas e os registros da estação ajudavam também. Entretanto apenas investigações atuais é que finalmente puderam traçar uma rota hipotética num primeiro momento. O homem veio de Sydney ou Port Augusta. Ele teria comprado o bilhete para Henley Beach e depois teria ido ao banheiro da estação para tomar banho, mas como estava fechado para manutenção, ele teve que caminhar por 30 minutos até o chuveiro público. Lá tomou banho e fez a barba. Quando voltou, percebeu que o seu trem já tinha partido. Então ele pegou o ônibus para Glenelg, provavelmente o próximo que estava disponível. O problema é que a rota não bate com as pistas encontradas. Os sapatos encontrados com o cadáver, por exemplo, não apresentavam desgaste e estavam muito bem limpos e engraxados, o que põe em xeque a teoria da caminhada de 30 minutos e também que ele tenha vagado pela cidade de Glenelg o dia todo. Não haviam ainda sinais de vômitos e convulsões, típicos de envenenamento nas roupas também. Então veio a pergunta: alguém teria largado o corpo limpo e em boas condições na praia?
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Antes suicídio, agora o caso rondava pela hipótese de assassinato. Mas esse caso estava longe de ser resolvido. Uma nova procura no corpo e nos pertences revelou que a calça continha um bolso secreto. Um papel foi encontrado com os dizeres “Taman Shud” (é aquele papel que aparece no começo da postagem, aliás). Estudiosos foram chamados e identificaram o idioma persa, cujas palavras remetiam ao significado de “terminado” ou simplesmente “fim”. O papel onde estavam impressas essas palavras era da última página de um livro de poemas chamado “Rubaiyat”, escrito por Omar Khayyam.
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A polícia divulgou fotos por todo o mundo em busca do livro de onde tinha sido arrancado aquele pedaço.  Depois de um tempo, um homem se apresentou com uma tradução de Edward FitzGerald publicada na Nova Zelândia. Ele disse que alguém tinha deixado o livro no banco de trás do seu carro numa noite em que tinha esquecido o veículo destrancado. A noite em questão era exatamente a de 30 de novembro de 1948. A última página do livro estava rasgada e o rasgo batia exatamente com aquele pedaço encontrado na calça. Na parte de dentro da capa havia ainda um número de telefone e anotações feitas à lápis que mais pareciam um código:
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    MRGOABABD
    MLIAOI
    MTBIMPANETP
    MLIABOAIAQC
    ITTMTSAMSTGAB
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Ninguém pode decifrar o código. O telefone não constava em nenhuma lista australiana, mas mesmo assim a polícia resolveu ligar. Eles descobriram que pertencia a uma ex-enfermeira que morava em Glenelg, a 800m do local onde foi encontrado o corpo. Ela contou que tinha um Rubaiyat quando mais jovem, mas que o tinha dado a um tenente do exército chamado Alfred Boxall durante seu serviço na segunda guerra mundial. O tenente lhe pediu a mão depois que a guerra tinha terminado, mas ela já tinha se casado ao retornar para casa. Ela também revelou que um homem desconhecido tinha perguntado por ela aos seus vizinhos em 1948. Apesar de seu nome ter sido apagado dos registros da polícia sobre o caso, investigações contemporâneas descobriram que era Jessica Ellen Thomson e que ela tinha morrido em 2007. Boxall foi encontrado e com ele a cópia do Rubaiyat dada pela enfermeira, com a última página intacta. Nenhum dos dois identificou o corpo. Um investigador da época declarou em um livro que escreveu sobre o caso que notou Jessica ter tido algumas reações suspeitas ao ver o molde de gesso do corpo, quase como se fosse desmaiar. Ainda assim ela negou conhecer o homem.
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Visto que as investigações não estavam adiantando em nada sobre a identificação do homem, o corpo foi finalmente enterrado. De repente flores começaram a surgir em seu túmulo. A polícia nunca descobriu quem estava depositando as flores no local.
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"Aqui jaz o homem desconhecido que foi encontrado na praia de Somerton em 1º de dezembro de 1948."
 
Um tempo depois, uma recepcionista do hotel Strathmore, que ficava em frente à estação, contou que um homem tinha se hospedado e depois saído em 30 de novembro de 1948. As camareiras encontraram uma caixa com uma seringa hipodérmica largada no quarto. Ninguém sabe, porém, se é o mesmo homem encontrado morto na praia. A seringa foi descartada pelo pessoal do hotel, então nunca a perícia pode realizar a análise.
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O Mistério Sobre o Mistério
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Embora a tecnologia atual possa ajudar a elucidar o caso, as pistas acabaram de alguma forma sumindo. A mala e os pertences foram destruídos em 1986, o corpo jaz em paz e provavelmente não restou nada da carne para uma investigação profunda, alguns fios de cabelo armazenados pela polícia tiveram o seu DNA praticamente destruído pelo formol, os patologistas da época se recusam a falar mais sobre o caso e vários arquivos e depoimentos sumiram misteriosamente.


Um programa de TV chamado 60 Minuts revelou os depoimentos de Kate, a filha da enfermeira Jessica. Ela contou que a enfermeira Jessica sabia quem era o homem, mas por algum motivo se recusou a falar sobre ele. Aparentemente a enfermeira também sabia falar russo, o que levantou a suspeita de que ela tenha talvez se envolvido em algum caso de espionagem soviética. Há quem não acredite nessa versão e diga que é apenas sensacionalismo. Outro fato interessante sobre o caso é que Jessica pode ter mentido sobre o seu nome depois que retornou da guerra. Alguns acreditam que seu possível nome anterior podia ser Jessica Ellen Harkness.
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Na cópia do livro dada ao tenente Boxell, ela assinou como “Jestyn”, um provável apelido que usava quando jovem. Sua filha disse que seus colegas de trabalho costumavam chamá-la de “Tyna”, por ser muito alta. Se juntarmos o apelido “Jess” e “Tyna” teremos “Jestyn”.
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Mas como o homem morreu? Se a hipótese de assassinato estiver certa, então o envenenamento é uma possibilidade. Alguns especialistas afirmam que há certos venenos que não podem ser identificados no corpo, mesmo que tenham sido injetados em quantidade maciça. Essas substâncias geralmente são mantidas longe do conhecimento do público em geral por motivos de segurança. Não sabemos, entretanto, se os vômitos e convulsões seriam reações comuns destes mesmos venenos. Porém, a posição do corpo pode ser uma pista que dá a entender que o homem sofreu uma convulsão antes de finalmente morrer, ou seja, a convulsão seria um sinal claro de envenenamento.
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Agora se juntarmos o fato de Jessica ter mentido sobre seu nome e principalmente por ter se envolvido na segunda guerra, então há uma forte hipótese de que ela possa ter de alguma forma matado o homem que era um espião soviético. E por que? Talvez tivesse sido seu amante. Ele ser um espião também explicaria o sumiço de várias pistas, além da escrita em códigos que ninguém consegue decifrar, nem mesmo os especialistas.
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O programa também mostrou que Jessica tinha um filho que já tinha falecido. A esposa e filha dele estão tentando conseguir uma autorização do governo australiano para exumar o corpo do homem estranho e fazer um exame de DNA. A suspeita é de que a enfermeira possa ter tido um filho com ele, o que explicaria por que o homem poderia ter ido atrás dela ou por que ela talvez não o quisesse por perto. Naquela época adultério era motivo suficiente para uma difamação desastrosa e destruidora para a família da pessoa.

Entretanto, o fato de ter um bilhete de trem não utilizado em seu bolso e um pedaço de papel com a palavra "terminado" poderiam explicar um possível suicídio. Se ele procurava a enfermeira, então pra que precisava de um bilhete de trem com hora marcada para o dia anterior ao dia de sua morte? Pra que largou o livro no carro de um desconhecido? Por que removeu todas as identificações de suas roupas? Certamente tinha algum motivo para não se identificar. Seria a mala de fato dele?

Ficam as perguntas: quem matou Odete Roitman o homem de Somerton? Por que alguém iria querer ele morto? O que a enfermeira escondia? E afinal, quem é esse homem? Penso que talvez a escrita em códigos seja a única coisa que possa de fato solucionar o caso, já que Jessica morreu. Talvez seja uma mensagem importante que nos dê muito mais do que apenas a identificação dele. De uma coisa sabemos: o homem estava diretamente ligado à enfermeira, pois possuía o telefone não registrado dela em um livro que curiosamente ela já conhecia.

E você, caro leitor (a)? O que pensa a respeito? Compartilhe com a gente aí nos comentários!

O assunto dessa postagem foi recomendado pelo leitor Bruno. Envie sua sugestão pra gente também!
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Veja Mais:
Documentário do 60 Minuts: link


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Liuka

É uma verdadeira draga de coisas inúteis e ao mesmo tempo interessantes.

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